MPF atende solicitação do Comitê estadual da Verdade e recomenda retirada de homenagens à ditadura em 80 espaços públicos no RN
- Saiba Mais
- 28 de abr.
- 5 min de leitura
Atualizado: 11 de mai.

Nas ruas de cidades como Natal, Macaíba, Goianinha e Parnamirim, o passado ainda resiste sob placas que homenageiam os generais-presidentes que comandaram o país sob a sombra do arbítrio entre 1964 e 1985. “Rua Presidente Médici”, “Praça Castelo Branco”, “Ponte Costa e Silva”, “Ginásio Humberto Castelo Branco” ou mesmo a data símbolo do golpe – “31 de Março” – seguem nomeando escolas, praças e logradouros, em uma permanência silenciosa da memória oficial da ditadura militar.
Agora, esse silêncio começa a ser rompido. O Ministério Público Federal (MPF) recomendou a retirada dessas homenagens do espaço público, inicialmente em 80 locais distribuídos por 10 municípios potiguares. A iniciativa é resultado de uma solicitação formal do Comitê Estadual por Memória, Verdade e Justiça do Rio Grande do Norte (CEV-RN), entregue no último dia 3 de abril ao procurador da República Emanuel Ferreira, na sede do MPF em Mossoró.
“Atuações como essa se inserem num contexto mais amplo em prol de uma colaboração interinstitucional para defesa da democracia. Nesse sentido, ela somente foi possível graças à provocação efetivada pelo Comitê Estadual da Memória, Verdade e Justiça do Rio Grande do Norte, através de diligente ofício encaminhado por Jana Sá, presidente do órgão. Com isso, as instituições deixam claro que a memória da ditadura militar não pode admitir nenhum tipo de homenagem aos responsáveis por graves violações de direitos humanos”, afirmou o procurador Emanuel Ferreira.
A presidenta do Comitê, Jana Sá, vê na medida um passo concreto na disputa por memórias.
Segundo levantamento inicial da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), pelo menos 542 ruas, praças, pontes, escolas, auditórios e outros equipamentos públicos no estado prestam algum tipo de tributo a agentes da repressão. A recomendação enviada a prefeituras, câmaras municipais, ao Governo do Estado e à Assembleia Legislativa estipula prazos para a realização de levantamentos próprios (90 dias), a mudança dos nomes (120 dias) e a apresentação de relatórios sobre as vítimas da ditadura nos municípios (180 dias). Caso não haja cumprimento, o MPF poderá ingressar com ações judiciais.
“A democracia não se afirma com homenagens a quem a violou. Precisamos, inclusive, educar as futuras gerações sobre o que significou esse período de exceção. Homenagens oficiais a esses nomes equivalem a um monumento ao esquecimento”, afirma Jana Sá.
O movimento do MPF se alinha a uma das recomendações da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que defendeu a revogação de títulos e homenagens a violadores de direitos humanos durante o regime militar. A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que já proibiu o uso de recursos públicos em comemorações relativas ao golpe de 1964, também dá sustentação à iniciativa da PRDC.
O procurador Emanuel Ferreira reforça o entendimento de que manter essas homenagens contribui para “a naturalização e a aceitação de um período autoritário, promovendo continuidades que normalizam tentativas de golpe ainda hoje no Brasil”.
A ação do Comitê Estadual por Memória, Verdade e Justiça ocorre em meio a um processo crescente de revisão crítica de homenagens públicas no estado. Em fevereiro, o Conselho Universitário da UFRN aprovou a retirada de títulos honoríficos concedidos aos ex-presidentes Castelo Branco e Emílio Garrastazu Médici. A decisão, tomada por unanimidade, foi considerada histórica.
“Quando conseguimos revogar os títulos de Castelo Branco e Médici na UFRN, celebramos um gesto de coerência ética com os princípios da universidade pública. Agora, ampliamos esse enfrentamento para os espaços que formam o cotidiano das cidades. A memória coletiva se constrói nas ruas”, diz Jana.
A lista inicial de locais com recomendações de renomeação abrange cidades como Natal, Macaíba, Monte Alegre, Nísia Floresta, Goianinha, Extremoz e Parnamirim. Na capital potiguar, por exemplo, permanecem até hoje locais como a “Ponte Presidente Costa e Silva”, a “Praça 31 de Março” e a “Escola Municipal Costa e Silva”, entre outros.
No Brasil, a Comissão Nacional da Verdade confirmou, em seu relatório final, ao menos 434 casos de mortes e desaparecimentos forçados durante a ditadura, número que não reflete a totalidade das vítimas. As violações incluem torturas, execuções, estupros, perseguições políticas, censura e supressão de direitos básicos.
“O que está em jogo é o tipo de sociedade que queremos construir. Não há democracia plena sem memória, sem verdade e sem justiça. E não há justiça possível quando os torturadores permanecem honrados no espaço público”, finaliza a presidenta do Comitê.
A recomendação do MPF marca o início de um processo que pode se estender a todo o estado. A luta, agora, também se trava nas esquinas, nas placas e nos nomes que carregamos ao andar pela cidade.
Municípios e espaços públicos com homenagens à ditadura identificados pelo MPF no RN
Extremoz
Rua 31 de Março – 59275-000
Rua General Figueiredo – 59275-000
Rua Presidente Castelo Branco – 59275-000
Rua Presidente Ernesto Geisel – 59275-000
Rua Presidente João Figueiredo – 59275-000
Rua Presidente Médici – 59275-000
Goianinha
Rua 31 de Março
Rua General Figueiredo
Rua Presidente Castelo Branco
Rua Presidente Ernesto Geisel
Rua Presidente João Figueiredo
Rua Presidente Médici
Macaíba
Rua 31 de Março
Rua General Figueiredo
Rua Presidente Castelo Branco
Rua Presidente Ernesto Geisel
Rua Presidente João Figueiredo
Rua Presidente Médici
Monte Alegre
Rua 31 de Março
Rua General Figueiredo
Rua Presidente Castelo Branco
Rua Presidente Ernesto Geisel
Rua Presidente João Figueiredo
Rua Presidente Médici
Natal
Escola Municipal Costa e Silva – Potengi
Praça Costa e Silva (antiga Praça do Galo) – Ribeira
Rua 31 de Março
Rua Castelo Branco
Rua General Figueiredo
Rua Presidente Ernesto Geisel
Rua Presidente Figueiredo
Rua Presidente Médici
Praça Marechal Humberto Castelo Branco – Tirol
Praça 31 de Março – Lagoa Nova
Praça Presidente Geisel – Candelária
Praça Marechal Castelo Branco – Tirol
Praça Presidente Figueiredo – Capim Macio
Praça Presidente Médici – Neópolis
Ponte Presidente Costa e Silva – BR-101
Ponte Presidente Geisel – Via Costeira (RN-313)*
Nísia Floresta
Rua 31 de Março
Rua General Figueiredo
Rua Presidente Castelo Branco
Rua Presidente Ernesto Geisel
Rua Presidente João Figueiredo
Rua Presidente Médici
Parnamirim
Complexo Esportivo Ginásio Humberto Castelo Branco – Centro
Rua 31 de Março
Rua Castelo Branco
Rua General Figueiredo
Rua Presidente Ernesto Geisel
Rua Presidente Figueiredo
Rua Presidente Médici
Complexo Geisel – Nova Parnamirim
Escola Municipal Presidente Figueiredo – Nova Parnamirim
Ginásio Poliesportivo Castelo Branco – Centro
Ponte Presidente Médici – Rio Pium (RN-063)*
Colégio Estadual Costa e Silva – Centro*
São Gonçalo do Amarante
Rua 31 de Março – Centro
Rua General Figueiredo – Centro
Rua Presidente Castelo Branco – Golandim
Rua Presidente Ernesto Geisel – Centro
Rua Presidente João Figueiredo – Centro
Rua Presidente Médici – Centro
São José de Mipibu
Rua 31 de Março
Rua General Figueiredo
Rua Presidente Castelo Branco
Rua Presidente Ernesto Geisel
Rua Presidente João Figueiredo
Rua Presidente Médici
Vera Cruz
Rua 31 de Março
Rua General Figueiredo
Rua Presidente Castelo Branco
Rua Presidente Ernesto Geisel
Rua Presidente João Figueiredo
Rua Presidente Médici
Mossoró
Escola Estadual Marechal Castelo Branco – Alto de São Manoel*
Escola Estadual Presidente Geisel – Bom Jardim*
Escola Estadual Presidente Médici – Santo Antônio*



Comentários