Posse do Comitê de Memória, Verdade e Justiça do RN ocorre terça, 07
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- 3 de mai. de 2024
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A posse do Comitê Estadual de Memória, Verdade e Justiça (CEV/RN) acontece na próxima terça-feira (07), às 10h30, no auditório da Governadoria, em Natal. O órgão colegiado tem caráter permanente, atendendo a uma reivindicação da sociedade civil organizada na luta por Memória, Verdade e Justiça, especialmente as vítimas diretas e familiares de mortos e desaparecidos políticos no período da ditadura militar de 1964.

O comitê é vinculado à Secretaria de Estado das Mulheres, da Juventude, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos (SEMJIDH). As eleições aconteceram no último mês de abril e a gestão eleita integra o mandato de 2024-2026, que é composto por entidades da sociedade civil com reconhecida atuação na promoção do direito à verdade, memória e justiça no RN.
A importância do CEV/RN é tornar Verdade, Memória e Justiça uma política pública de responsabilidade do Estado, afirma Juliana Silva, Coordenadora de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da SEMJIDH e que participou da comissão eleitoral.
“O Rio Grande do Norte é um estado em que aconteceram crimes de tortura e de assassinatos relacionados à ditadura civil militar, e os familiares, filhos e filhas, netos e netas dessas pessoas até hoje reclamam esse legado e essa trajetória política das pessoas que foram assassinadas e torturadas pela ditadura. Então a importância do Comitê é justamente esse reconhecimento, enquanto Estado, desses crimes que foram cometidos na ditadura. É o reconhecimento por parte da própria instituição do Estado de que houveram crimes que violaram gravemente direitos humanos nesse período aqui”, afirma.
Além disso, a preservação da memória também é um dos principais ideais do CEV/RN.
“Acredito que é um atendimento muito justo a demandas históricas, mas que também tem a ver com a construção de uma memória de não repetição de períodos ditatoriais no Estado, no país, como uma forma de zelar pela memória, no sentido de fazer justiça às pessoas que perderam suas vidas lutando pela nossa democracia”, ressalta Silva.
O comitê terá autonomia para analisar questões que envolvem a memória política, requerer que sejam revistas homenagens aos violadores de direitos humanos e propor a implantação de espaços de acesso à informação e preservação da memória coletiva.
“A gente vai fazer todo um trabalho de levantamento, consultar os arquivos do nosso estado, conversar com pessoas que foram vítimas desse período, conversar com seus filhos e seus netos, pensar a nossa cidade também. É importante dizer que esse Comitê tem a perspectiva de pensar o nosso espaço urbano e rural também como um espaço de produção de memória e de verdade, no sentido de olhar para os nossos prédios antigos, olhar para as estruturas e relembrar qual foi a função de cada um desses espaços no período da ditadura”, pontua Silva.
“E, a partir disso, a gente procura a justiça no sentido não só da construção da memória e das narrativas de verdade, mas também que a gente consiga a justiça, que essas pessoas sejam devidamente homenageadas, mas também que os torturadores tenham seus nomes explicitados e a gente consiga ter acesso a esse acervo também”.
Thales Dantas, presidente do Comitê Estadual Intersetorial de Atenção aos Refugiados, Apátridas e Migrantes do RN (CERAM/RN), também parte da comissão eleitoral, pontua a importância de, finalmente, o RN tratar a questão de Memória, Verdade e Justiça de forma mais concreta.
“A ideia é que o Comitê seja uma das referências nacionais nessa perspectiva de resgate. Então é um processo que o governo do estado está impulsionando e sendo pioneiro, porque a gente [RN] nunca fez esse momento de olhar o que aconteceu no passado na época da ditadura militar, para lembrar o que de fato aconteceu e principalmente manter vivo esse tema”, diz.
Dantas ainda ressalta a falta de visibilidade sobre os crimes promovidos pela ditadura militar.
“Existe uma invisibilidade pelo que aconteceu no período ditatorial aqui no Brasil. Ninguém fala sobre, é como se do dia para a noite a gente acordasse na democracia que a gente tem hoje, na Nova República, como se fosse num estalar de dedos. Mas muitas pessoas sofreram – se não foram mortas ou desaparecidas, foram perseguidas. Então a gente tem que falar sobre isso. Não se pode esquecer dos crimes e do horror que foi a ditadura militar e o que as consequências nefastas desse período causam até hoje no Brasil”, ressalta.
Vale dizer que caberá à SEMJIDH disponibilizar o suporte administrativo, operacional, logístico e financeiro ao funcionamento do CEV/RN.
Mais de uma década de espera
Fruto de uma demanda da sociedade civil apontada no Plano Plurianual Participativo — ou PPA Participativo – do RN, o Comitê da Memória, Verdade e Justiça do Rio Grande do Norte foi criado pela governadora Fátima Bezerra (PT) em 27 de dezembro do ano passado, por meio de decreto, 11 anos e sete meses após a instituição da Comissão Nacional da Verdade (CNV) pelo governo Dilma Rousseff (PT).
Com o objetivo de colaborar com a formulação e execução da Política Estadual de Verdade, Memória e Justiça, o CEV/RN é a primeira ação concreta do estado do RN nesta área, lembrando que no estado só foi implementada Comissão da Verdade no âmbito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
A CNV foi criada em maio de 2012 com o objetivo de apurar os casos de violações aos direitos humanos praticadas pelo Estado brasileiro entre os anos de 1946 e 1988, principalmente, durante os 21 anos da ditadura militar iniciada em 1964. A iniciativa inspirou a criação de órgãos semelhantes no âmbito estadual e municipal, inclusive, em órgãos que não fazem parte do Estado, como os sindicatos.
Até então, no Rio Grande do Norte, coube somente à UFRN produzir sua Comissão da Verdade para investigar os crimes da ditadura no âmbito da universidade. A Comissão foi objeto de pesquisa durante quase três anos; o documento final foi publicado em outubro de 2015 com 489 páginas.
O relatório divulgado pela Comissão da Verdade em 2017 fez uma série de 12 recomendações à UFRN. Do total, seis foram gerais e de âmbito administrativo. As demais foram recomendações específicas;
Os números gerais da UFRN mostram
– 5 (cinco) professores e 33 (trinta e três) estudantes presos;
– 25 (vinte e cinco) professores e 2 (dois) estudantes sofreram o expurgo ideológico do Regime militar;
– 13 (treze) membros da UFRN foram vítimas de tortura ou tratamento degradante;
– 1 (um) estudante expulso pelo Decreto-Lei nº 477;38
– 10 (dez) sofreram repressão política oficial, mas não foram presos;
– 2 (dois) estudantes foram assassinados pelo Regime militar em circunstâncias políticas (Emanuel Bezerra dos Santos, estudante da Faculdade de Sociologia e Política, e José Silton Pinheiro, estudante da Faculdade de Educação da UFRN);
– 1 (um) professor é tido como desaparecido político pela Lei nº 9.140/1995 (Luiz Ignácio Maranhão Filho, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Natal);
– 259 (duzentos e cinquenta e nove) membros da Universidade (Professores, alunos e servidores técnico-administrativos foram fichados pelos órgãos de repressão e informações da Ditadura Militar).
Relação dos 12 mortos e desaparecidos no RN
Anatália de Souza Alves de Melo;
Édson Neves Quaresma;
Emmanuel Bezerra dos santos;
Gerardo Magela Fernandes;
Hiram de Lima Pereira;
José Silton Pinheiro;
Lígia Maria Salgado Nóbrega;
Luíz Ignácio Maranhão Filho;
Virgílio Gomes da Silva;
Zoé Lucas de Brito;
Djalma Maranhão (morto no exílio decorrente da ditadura);
Glênio Sá (pós-ditadura em circunstâncias suspeitas).
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